Fuçando no blog Não Dois Não Um, encontrei um texto MARAVILHOSO, o Coisa Alguma de Fábio Rodrigues. Desculpe o “roubo”, mas gostei tanto que tive que postar aqui.
COISA ALGUMA
Fábio Rodrigues
“A cada dia
Vamos mais perto
Do outro, daquele,
Enfim, o certo.”
Não servirão as preces que aprendemos na infância ou essas que às vezes murmuramos. Que um homem tenha morrido, não nos serve, seu sofrimento ou o de outro – importa pouco: somos iguais em dor. Estes desenhos que você faz ainda, aqueles que eu mesmo costumava fazer. A memória, essa voz, essas imagens que nos assombram sem cessar. O esquecimento que às vezes desejo, que às vezes detesto. O filme e a música que outro dia nos fez chorar. O instrumento que eu quis tanto aprender – que nao é mais que madeira e aço. As pessoas por quem nos perdemos em paixão e a própria paixão que é a mesma, sempre. As três palavras dos que amam (as mesmas, sempre), que prometemos não esquecer – não lembramos então que prometer é desnecessário. O filho que eu temo mas terei, e o teu que não vou conhecer. A história que poderia ter sido nossa, a outra vida que sigo imaginando. O trabalho, a persistência, a resignação, o pão, a amizade e todas as coisas pelas quais nao me interessei. A soberba. O desamor. A morte. O meu medo, o meu medo sem fim. Coisa alguma nos salva.
E ademais estamos sós. Eu te falo e te ouço, tocamos as mãos e nos olhamos, às vezes, com uma pequena alegria ou um secreto desengano, e ainda assim, ainda assim não nos encontramos. Do início a um fim que entrevemos com pavor disfarçado, lado a lado, atravessamos sós.
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